A cidade do Rio de Janeiro promete ser palco de uma das eleições mais disputadas do país. Seis principais candidatos estão no páreo para a sucessão do prefeito Cesar Maia: o senador Marcelo Crivella (PRB), a ex-deputada federal Jandira Feghali (PCdoB), o deputado estadual Alessandro Molon (PT), os deputados federais Fernando Gabeira (PV), Chico Alencar (PSOL) e Solange Amaral (DEM). Todos eles possuem características políticas diversificadas, mas com um ponto em comum – pouca ou nenhuma experiência administrativa. O cientista político e chefe do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, Ricardo Ismael, analisou o quadro pré-eleitoral da cidade. Para ele, o candidato que se revelar mais bem preparado para administrar a capital fluminense conquistará a preferência do eleitorado. “As principais exigências do eleitor ainda são saúde, educação, segurança pública, saneamento básico e emprego. O candidato que oferecer propostas concretas para tais áreas, certamente, ganhará a preferência do eleitorado”, explica ele nessa entrevista.
CARLYLE JUNIOR – Qual será o critério para a escolha do novo prefeito, considerando que a maioria dos candidatos não apresenta nenhuma ou pouca experiência administrativa?
RICARDO ISMAEL – Com exceção da deputada Solange Amaral, que já foi secretária municipal na gestão atual e acabou adquirindo certa experiência administrativa, os demais candidatos possuem maior experiência parlamentar. É o caso do senador Marcelo Crivella, dos deputados federais Fernando Gabeira e Chico Alencar, do deputado estadual Alessandro Molon e da ex-deputada Jandira Feghali (desde março do ano passado, ela é secretária municipal de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia de Niterói). Mas é importante que o político tenha experiência parlamentar, já que como prefeito ele terá que lidar com a relação entre o Executivo e o Legislativo. Como praticamente todos os candidatos vêm do Legislativo, isso faz com eles conheçam bem o jogo político.
Um requisito exigido pelos eleitores nas últimas eleições, principalmente em grandes metrópoles como o Rio de Janeiro, é que o candidato a prefeito possa demonstrar, durante a campanha, que conhece os problemas da cidade e, mais do que isso, que ele possa demonstrar que é habilitado para enfrentá-los. Em agosto, quando for liberada a propaganda eleitoral gratuita, os candidatos terão a oportunidade de apresentar suas propostas e soluções para os problemas da cidade do Rio. A eleição será bastante concorrida. O nível de competitividade será alto, já que seis principais candidatos estão na disputa. Opções não faltam para o eleitor carioca.
C.J – Nas eleições deste ano, os candidatos possuem posturas bem definidas quanto alguns temas polêmicos. No Congresso Federal, Jandira Feghali defendeu a legalização do aborto e Fernando Gabeira luta pela descriminalização da maconha e pela união civil entre homossexuais. Já o senador Marcelo Crivella e o deputado estadual Alessandro Molon estão diretamente ligados a questões religiosas. O senhor acredita que isso servirá de munição para os candidatos se atacarem nas campanhas, prejudicando o debate político?
R.I – A legalização do aborto ou da maconha e a união civil de homossexuais são temas para o Congresso Federal. Essas são questões que não devem ser discutidas no bojo da escolha de um prefeito. Cabe ao Poder Legislativo decidi-las. Acredito que o eleitor não se deixará influenciar por essas questões para definir a escolha do seu candidato. As principais exigências do eleitor ainda são saúde, educação, segurança pública, saneamento básico e emprego. O candidato que oferecer propostas concretas para tais áreas, certamente, ganhará a preferência do eleitorado. Mas é claro que num certo momento da campanha eleitoral, esses temas polêmicos servirão de munição para alguns candidatos atacarem seus oponentes. Por exemplo, o conservador Marcelo Crivella, que nessa fase pré-eleitoral lidera as pesquisas, certamente será alvo de ataques mais na frente.
C.J – O governo do presidente Lula registrou a melhor popularidade em abril deste ano desde que o petista assumiu o governo em 2003. De acordo com a pesquisa CNT/Sensus, (http://www.cnt.org.br/informacoes/noticia.asp?cod=15829), entre os entrevistados, 57,5% avaliaram o governo como positivo. O senhor acredita que os candidatos a prefeito ligados a base governista federal tendem se aproveitar dessa aproximação na corrida eleitoral deste ano?
R.I – Em toda eleição surge, entre os especialistas em política e a mídia, a pergunta: qual será o perfil do candidato que o eleitorado procura nas eleições deste ano? Analisando algumas candidaturas, percebo que existem alguns candidatos ligados à base governista, o senador Marcelo Crivella, a ex-deputada Jandira Feghali e o deputado estadual Alessandro Molon, que se forem eleitos, provavelmente, farão um discurso de que eles terão uma relação mais estreita com o governo federal e o presidente Lula. E no caso do Alessandro Molon, ele deverá ter uma relação mais estreita com o governador Sérgio Cabral, já que a aliança PT/PMDB, em tese, proporcionaria uma parceria entre a cidade e o estado do Rio de Janeiro e Governo Federal. Mas eu acho que tanto Jandira Feghali quanto Marcelo Crivella também vão se valer dessa aproximação com o governo Lula como estratégia de campanha, uma vez que o PRB e PCdoB fazem parte do bloco governista.
C.J – A grande maioria dos candidatos parece querer distância política do prefeito Cesar Maia. Como a deputada Solange Amaral enfrentará essa ligação?
R.I – Embora nesse momento a deputada estadual Solange Amaral tente dissociar sua imagem da atual administração, ela não tem como escapar da idéia de uma continuidade da gestão do prefeito Cesar Maia, que está encarando uma queda na popularidade. Por isso, Solange terá dificuldades para encontrar um discurso que possa convencer os eleitores de que fará uma gestão autônoma. A criatura não pode renunciar o seu criador. Não existe Solange Amaral sem Cesar Maia.
No entanto, não podemos esquecer que o apoio da máquina municipal ainda pode ser determinante no pleito de outubro. Aparentemente, o apoio da máquina da prefeitura pode parecer insuficiente para vencer a eleição. Mas talvez possa ser importante para levar a candidata do DEM para um segundo turno. Não concordo com algumas análises que colocam o prefeito Cesar Maia como um ator irrelevante do cenário político deste ano. É bem verdade que o Cesar Maia tem se esquivado do debate político por conta da epidemia de dengue e da desordem urbana. Se a eleição for, de fato, muito disputada, o apoio do atual prefeito, mesmo que nos bastidores, através dos seus vereadores ou de ações da prefeitura, como as obras municipais nos bairros da Zona Oeste, por exemplo, pode garantir a chance de Solange Amaral concorrer o segundo turno em novembro, talvez. A eleição é um processo que depende muito da aglutinação de forças políticas. Os candidatos precisam de uma estrutura partidária forte ou de um aparato por parte dos governos que dêem um suporte para as candidaturas. Nesse caso, nenhum tipo de ajuda pode ser recusada ou desprezada.
C.J – Como o senhor avalia a candidatura do deputado federal Fernando Gabeira?
R.I – O Gabeira tem toda uma história política vinculada à cidade do Rio de Janeiro. É um deputado que marcou sua trajetória pela defesa de questões ambientais e, mais recentemente, pela ética na política. Gabeira tem um discurso muito fácil de ser comprado e de ser absorvido pelas classes média e alta da cidade. E isso não é pouco. O grande desafio do Gabeira é tentar ganhar o apoio de camadas mais populares e buscar votos nas Zonas Norte e Oeste. Numa primeira análise, Gabeira seria o candidato mais forte para rivalizar com um candidato da base governista. Imaginando que haja uma disputa entre um candidato pró-Lula e um candidato de oposição, o Gabeira é o que, potencialmente, teria mais chance de crescer na corrida eleitoral.
C.J – Na última pesquisa Datafolha, o senador Marcelo Crivella ocupou o primeiro lugar das intenções de votos. E também o de mais rejeitado pelos entrevistados.
(http://datafolha.folha.uol.com.br/po/ver_po.php?session=550). O que o candidato do PRB terá que fazer para superar esse impasse?
R.I – O senador Marcelo Crivella deverá preparar um discurso para os eleitores que não são fiéis da Igreja Universal. Crivella é um candidato que consegue falar mais facilmente para as camadas populares. O seu eleitorado se concentra nas Zonas Norte e Oeste da cidade. Ao contrário de Gabeira, ele tentará buscar a simpatia das classes média e alta, que não se identificam com o seu discurso. É um típico candidato que consegue ir para um segundo turno, mas não se elege. Para conquistar a maioria absoluta dos votos, Crivella deverá atingir as pessoas que não fazem parte do seu eleitorado tradicional. E isso não é tarefa fácil.
C.J – O Senhor acredita que, mesmo por um partido pequeno como o PSOL, o deputado Chico Alencar tenha chances de crescer junto ao eleitorado?
R.I – Na eleição municipal de 1996, o deputado federal Chico Alencar obteve uma boa colocação e quase chegou ao segundo turno. Certamente, ele deverá se aproveitar da popularidade da ex-senadora e presidente do PSOL, Heloísa Helena, que foi muito bem votada no Rio nas eleições presidenciais de 2006. Nas pesquisas de intenções de votos para as eleições de 2010, Heloísa Helena ainda é fortemente cotada no estado do Rio de Janeiro. Por isso, acredito que o Chico Alencar deverá contar com o apoio da ex-senadora na campanha. Além disso, a candidatura do Chico Alencar aparece como opção para os eleitores que desejam a possibilidade de uma gestão que faça oposição aos governos municipal, estadual e federal. Mas isso também pode ser um entrave na campanha de Alencar, já que ele terá que enfrentar três máquinas: a do prefeito Cesar Maia, a do governador Sergio Cabral e a do presidente Lula.
C.J – Embora o deputado estadual Alessandro Molon conte com o apoio dos governos federal e estadual, seu nome ainda é pouco conhecido pelo eleitorado carioca. De acordo com a última pesquisa Datafolha, o candidato do PT conseguiu apenas 1% das intenções de votos. (http://datafolha.folha.uol.com.br/po/ver_po.php?session=550) A candidatura de Molon tem possibilidade de crescer?
R.I – O Alessandro Molon ainda pode crescer muito na campanha. Dentre todos os candidatos, ele é o que terá maior tempo de propaganda na TV, por conta da aliança PT/PMDB. Então é a oportunidade que ele tem para divulgar seu trabalho e suas propostas. Um candidato, que, de fato, tenha o apoio do governador Sergio Cabral e do presidente Lula, deve ser olhado com mais atenção. E por isso, o deputado estadual Alessandro Molon tenha chance de crescer nas pesquisas. Além disso, ele tem uma vida limpa. Até onde eu saiba, não há nada que desabone sua atuação como parlamentar. Ele tem se destacado como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj. O deputado Molon é um candidato jovem que terá um grande desafio pela frente. Ele não é único candidato da base governista federal, tem ainda a Jandira Feghali e o Marcelo Crivella. E por coincidência, esses dois estão liderando as pesquisas. Ou seja, durante os programas eleitorais, a Jandira e o Crivella, provavelmente, vão se vincular à imagem do presidente lula. Embora faça parte do mesmo partido de lula, o PT, Molon não terá a exclusividade do governo federal.
C.J – Ainda há dúvidas quanto o apoio do governo do estado e do PMDB à candidatura de Alessandro Molon. Será que o governador Sergio Cabral vai, de fato, se engajar na campanha do PT para dar vitória ao Molon?
R.I – Até agora ainda não está muito claro se o PMDB realmente “comprou” a candidatura do Molon ou se o governador Sergio Cabral apenas atendeu um pedido do presidente Lula. O estado do Rio tem recebido enormes e vultosos investimentos do programa de aceleração do crescimento, o PAC. Se observarmos a rigor, a maioria das obras em curso no estado é do governo federal. O caixa do governo estadual está muito ruim. Portanto, esses investimentos do governo federal determinam uma boa avaliação da gestão Sergio Cabral por parte da população. Até mesmo internamente no PT, eu tenho dúvida se a candidatura de Molon tem a aprovação de todo o partido. A escolha dele para candidato do PT pode significar uma renovação no partido e, talvez, a aposentadoria de algumas lideranças. O Molon saiu na frente de nomes como Edson Santos e Wladimir Palmeira.
C.J – Faltando cinco meses para o primeiro turno das eleições, já é possível traçar um cenário possível para a disputa?
R.I – Se não houver nenhuma surpresa, que às vezes acontece, a princípio o cenário possível seria um candidato da base governista enfrentando um candidato de oposição no segundo turno. Se isso se confirmar, o Alessandro Molon terá dificuldades na disputa, já que a Jandira Feghali e o Marcelo Crivella, que também são candidatos do governo, possuem um eleitorado mais amplo. Já o deputado federal Fernando Gabeira seria o representante da oposição. Outra situação possível seria dois candidatos da base governista disputando o segundo turno. Assim, Jandira Feghali e Marcelo Crivella sairiam na frente.
Carlyle Junior